Gdeim Izik – Relatório de advogadas francesas desmascara juicio farsa marroquino
A Sra. Ouled e a Sra. Metton, advogadas francesas, que representavam os Prisioneiros Políticos Saharauis do Grupo Gdeim Izik, apresentaram um relatório detalhado sobre este caso que denuncia todas as ilegalidades e a tortura sistemática que esses 24 acusados sofrem há quase sete anos.
No relatório também se incluem 3 contra-perícias dos exames médicos dos prisioneiros e as autópsias que foram “dadas” aos advogados apenas sete anos após os eventos, mas não apresentadas no tribunal, nem nunca foi apresentado nenhum cadáver.
A próxima sessão de julgamento, que se acredita ser a última, começará no dia 11 de julho, depois que a parte civil no seu argumento final pediu mudança das acusações para actos contra a segurança interna de Marrocos, que não é mais que acusação de terrorismo interno e acusou a Frente Polisario e a Argélia de serem inimigos do Reino.
Em 16 de maio, os prisioneiros políticos e seus advogados retiraram-se do processo. Os acusados declararam que não continuariam a participar numa ” peça de teatro chamada de julgamento”, onde “a presunção de inocência está totalmente ausente” e “não é mais do que a repetição do tribunal militar de 2013”.
-
Sra. Ouled e a Sra. Metton, publicaram um relatório muito detalhado sobre o caso Gdeim Izik, como você se envolveram neste caso?
A Dra. Metton é especialista em direito internacional humanitário e direito penal, ela é a advogada de Naama Asfari, um dos acusados. O seu escritório apresentou uma queixa em seu nome em França e ganhou um procedimento no Comitê contra a tortura.
A Dra. Ouled trabalhou para o governo francês como assessora jurídica de direito internacional e europeu. Ela é especializada em casos de asilo para saharauis.
-
No dia 16 de maio foram expulsas pela força do tribunal em presença e por ordens do juiz presidente, este é um procedimento normal num país que diz respeitar a lei?
A nossa expulsão em 16 de maio é a evidência de que não há respeito pelas regras do direito no tribunal de apelação de Rabat e pela justiça marroquina.
É absolutamente incomum expulsar os advogados de defesa durante a apresentação da alegação , e é um dos principais crimes contra o direito à defesa que pode ser feito.
-
Quais são os pontos principais que gostariam de salientar que demonstram a inocência dos 24 acusados?
Todos os pontos principais que demonstram a inocência foram indicados pelos tribunais nacionais e internacionais: não há provas da culpa dos 24.
O tribunal militar condenou e prendeu os réus principalmente com base nas suas confissões, os réus denunciaram que as forças de segurança os torturaram e forçaram a assinar declarações que não haviam lido. O processo não mostra evidências de que o tribunal tenha conduzido um exame médico a qualquer arguido para verificar se há provas de abuso.
A acusação ofereceu poucas evidências além das declarações policiais dos arguidos.
O tribunal ouviu apenas uma testemunha da acusação, o bombeiro Redouane Lahlaoui, que não reconheceu qualquer acusado. Nenhum agente da polícia testemunhou.
A acusação também apresentou armas que a polícia teria apreendido no acampamento. No entanto, a acusação não abordou qualquer evidência que ligue as armas aos réus além de “confissões” em que eles admitiram a sua posse e uso (nenhum teste de DNA efectuado, por exemplo).
Além disso, nenhum relatório de autópsia foi apresentado no julgamento para elucidar como e quando cada um dos agentes da força de segurança havia morrido. O tribunal não estabeleceu qual dos arguidos causou a morte dos agentes da lei.
O Tribunal de cassação anulou esta decisão que mostra que: 1. Não há vítimas; 2. Nenhuma evidência dos assassinatos; 3. Nenhuma evidência de ligação entre o acusado e os policias mortos.
Além disso, o Comitê contra a tortura declarou que Marrocos torturou Naama Asfari, um dos acusados, e usou a sua declaração obtida sob coerção para declará-lo culpado. Assim, não há evidências senão as suas próprias declarações. E este é o caso de todos os acusados.
E os advogados da parte civil declararam que não havia provas para demonstrar que os 24 eram culpados de assassinatos.
-
Acreditam que seja um julgamento criminal?
Um julgamento criminal precisa respeitar os princípios básicos do direito penal e do processo penal: um tribunal imparcial mostra a devida diligência ao tentar determinar se há provas suficientes para declarar alguém culpado de um crime.
Neste caso isso não se verificou: as condenações são injustas para os réus.
Quase todos os acusados eram conhecidos por envolvimento político para a autodeterminação, ou serem ativistas saharauis e / ou de direitos humanos. Esta é a verdadeira razão pela qual eles são perseguidos pela justiça marroquina.
Além disso, durante os 6 meses de julgamento e, especialmente, no final, o presidente, o procurador e os advogados da parte civil tentaram demonstrar um vínculo entre os acusados e a Frente Polisario e também um terceiro país, a Argélia. O objetivo é querer mostrar que os acusados são marionetas de forças políticas tentando desestabilizar Marrocos.
A justiça marroquina fez deste julgamento um julgamento político.
- O representante legítimo do povo saharaui é a Frente Polisario, o movimento de libertação, é aquele que assinou o acordo de cessar-fogo e que se senta na mesa de negociação nas Nações Unidas.
Foi também a Polisario que apresentou um processo legal contra a exploração ilegal dos Recursos Naturais por Marrocos e ganhou o caso no Tribunal de Justiça Europeu, o que está a provocar algum prejuízo financeiro ao Reino de Marrocos que viu já detidas várias cargas marítimas de produtos ilegais.
Acreditam que o grupo de Gdeim Izik está sendo usado pela máquina de propaganda de Marrocos para fabricar uma ligação de terrorismo e, portanto, desacreditar a Frente Polisario?
A estratégia de apresentar um movimento de independência como grupo terrorista é uma estratégia muito antiga, que a França usou na Argélia, por exemplo.
Hoje em dia, você só precisa dizer terrorismo para poder fazer todo o possível, mesmo a prisão de 21 pessoas que devem ser até hoje consideradas inocentes.
Na verdade, o facto de que o Tribunal de Recurso tenta demonstrar que os acusados estão vinculados com a Frente Polisario e que são terroristas, é realmente uma confissão de que os acusados são perseguidos por sua opinião política e seu activismo.
-
Há dezenas de prisioneiros políticos saharauis detidos por Marrocos em condições desumanas e sujeitos à tortura sistemática, porquê o mundo está em silêncio?
Marrocos cria um Omertà real (lei do silêncio) em torno dos saharauis: os jornalistas são proibidos no território ocupado, os advogados são expulsos, ativistas de direitos humanos, etc. … e isso funciona.
Além disso, Marrocos tem o apoio de um país poderoso, como é a França.
- Podem explicar-nos a importância da participação de observadores internacionais, advogados e activistas de direitos humanos, neste julgamento?
O trabalho de observadores e ativistas internacionais é essencial para obter testemunhas do que está a acontecer e ajuda os advogados, dando-lhes informações independentes sobre a realidade nos tribunais marroquinos.
Existem poucos representantes de Estados nesses julgamentos. Sem esses observadores, advogados e ativistas de direitos humanos, a questão da tortura e violação dos ativistas saharauis nunca teria sido denunciada ao mundo.
Relatório integral aqui:
https://pt.scribd.com/document/351826013/Rapport-Defense-Gdeim-Izik-15-Juin-2017